Já sentiu que muitos dos seus valores e convicções foram moldados através de filmes, séries e desenhos animados? Crescemos idolatrando figuras como o Homem-Aranha, cuja máxima “com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades” incutiu em nós a noção de heroísmo e altruísmo. Já He-Man, além de suas lições de moral no final de cada episódio, pode ter inspirado uma geração a ingressar na academia para buscar o “shape bombado”.
Além disso, séries como Power Rangers ensinaram sobre a importância da amizade, lealdade e sacrifício pessoal, enquanto ThunderCats reforçou valores de justiça e integridade. Esses programas não eram meros passatempos; eles eram lições de vida embaladas em aventuras emocionantes que nos mantinham colados à tela, ansiosos por cada novo episódio. Até mesmo Chaves, com seu humor inocente e situações cotidianas, nos ensinou sobre a simplicidade, a importância da comunidade e como encontrar alegria nas pequenas coisas da vida, apesar das adversidades.
Pois é, não é coincidência. Através do entretenimento é possível moldar toda uma sociedade e esse fenômeno não é exclusivo do Ocidente.Durante a Guerra Fria, a União Soviética (URSS) produziu seus próprios filmes, séries e desenhos animados, muitos dos quais foram criados não apenas para entreter, mas também para incutir valores socialistas e princípios comunistas na população. Estes meios de comunicação serviam como ferramentas de propaganda, destinadas a reforçar a ideologia do Estado, promover a unidade nacional e destacar a luta contra os inimigos ideológicos.
Coisa do passado? Até hoje a Coreia do Norte adota uma abordagem semelhante e vive numa bolha só dela, onde até mesmo um amistoso com o poderoso Atlético Sorocaba virou um jogaço contra a Seleção Brasileira. A produção cinematográfica e televisiva no país é cuidadosamente orquestrada para promover os valores do Partido dos Trabalhadores da Coreia, ensinando as crianças desde cedo a adorar seus líderes e a desconfiar do mundo exterior.
Inspirado por uma fascinante exposição feita por Júlio Lobo, psicólogo e criador de conteúdo do canal Sobrevivencialismo, este artigo se aprofunda na complexa teoria da subversão cultural através do entretenimento. Como o cinema e a TV podem servir não apenas como formas de lazer, mas também como ferramentas poderosas para manipular os valores sociais e enfraquecer as fundações culturais de uma sociedade. A tática, que dispensa o uso de força militar, utiliza a mídia para infiltrar e alterar a percepção pública sobre questões fundamentais como família, educação e lei e ordem, promovendo uma gradual desmoralização.
Ex-agente da KGB detalha prática
A manipulação do entretenimento pode ser vista como uma ferramenta poderosa na estratégia de subversão cultural, uma tática que visa enfraquecer e eventualmente dominar sociedades sem o uso de força militar convencional. Esta abordagem foi detalhadamente exposta por Yuri Bezmenov, um ex-agente da KGB que desertou para o Ocidente, revelando como a União Soviética poderia ter empregado tais métodos para infiltrar e desestabilizar nações inimigas de dentro para fora.
A teoria da subversão de Bezmenov descreve um processo meticuloso dividido em quatro fases: desmoralização, desestabilização, crise e normalização. No contexto do entretenimento, a fase de desmoralização é particularmente relevante. Segundo Bezmenov, o objetivo é corroer os valores fundamentais de uma sociedade atacando suas instituições culturais e morais, incluindo a religião, a educação, os laços sociais, a lei e a ordem, e o trabalho. Dentro desse esquema, o entretenimento serve como um veículo para ridicularizar e minar esses valores, promovendo narrativas que contrastam agudamente com as tradições e normas culturais estabelecidas.
Longas metragens, seriados e animações podem ser utilizados para questionar ou satirizar figuras de autoridade, ridicularizar crenças religiosas, promover ideologias contrárias aos valores predominantes da sociedade, e retratar a lei e a ordem de forma negativa. Ao fazê-lo, esses meios de entretenimento contribuem para a desmoralização cultural, preparando o terreno para as fases subsequentes de desestabilização e crise, conforme delineado por Bezmenov.
A educação, sendo um dos pilares da desmoralização, também pode ser influenciada pelo conteúdo do entretenimento, que muitas vezes desafia os currículos tradicionais e promove uma visão de mundo alternativa. Essa abordagem pode levar a uma geração de indivíduos mais inclinados a questionar e rejeitar os valores e estruturas existentes, facilitando a desestabilização social.
Os vínculos sociais, outro alvo da subversão, podem ser enfraquecidos através de narrativas que promovem o individualismo extremo, o conflito entre grupos e a desconfiança nas instituições. Ao fragmentar a coesão social, o entretenimento pode desempenhar um papel na erosão da solidariedade comunitária e nacional, um objetivo chave da subversão.
Por fim, o entretenimento pode ser usado para alterar as percepções sobre o trabalho e as relações laborais, pintando os empregadores de forma negativa e glorificando a resistência contra as estruturas de poder econômico. Tal retrato serve ao propósito de desmoralizar o trabalho e promover a insatisfação e o descontentamento entre as classes trabalhadoras.
A análise da queda da Roma Antiga como um símbolo da erosão interna de valores morais e sociais exemplifica que o declínio interno de uma civilização pode ser tão devastadora quanto a conquista por forças externas. Este episódio histórico destaca vividamente o desfecho da desmoralização e do abandono de valores culturais essenciais, atuando como um alerta severo para as sociedades modernas sobre os efeitos perniciosos da subversão cultural.
Teoria da conspiração?
A percepção de uma onda de filmes considerados medíocres, onde a ênfase em mensagens politicamente corretas ou “lacração” parece sobrepor-se à qualidade da narrativa ou fidelidade ao material de origem, tem gerado debates acalorados entre fãs e críticos, com fracassos nas bilheterias. Esta tendência é frequentemente discutida em termos de teoria da conspiração, sugerindo que existe um movimento coordenado dentro da indústria do entretenimento para promover certas agendas ideológicas em detrimento da arte e da história.
Pegamos a Marvel Studios como exemplo. Durante as fases 1, 2 e 3, filmes como Homem de Ferro, Os Vingadores e Capitão América: Guerra Civil conseguiram capturar a imaginação do público com narrativas envolventes, personagens complexos e um equilíbrio habilidoso entre ação, humor e drama. Esses filmes foram elogiados não apenas por sua fidelidade ao espírito dos quadrinhos, mas também por sua capacidade de abordar temas profundos e universais, fazendo com que o público se importasse profundamente com os heróis na tela.
No entanto, à medida que o MCU avançou para suas fases mais recentes, começaram a surgir críticas de que os filmes mais novos estão mais focados em promover agendas políticas e sociais, conhecidas popularmente como “cultura woke”, em detrimento da qualidade da história e do desenvolvimento de personagem. Relatos de roteiristas contratados pela Marvel Studios que nunca leram uma história em quadrinhos e diretores instruídos a não se familiarizarem com o material original apenas exacerbaram as preocupações de que a autenticidade e a paixão pelo universo de super-heróis estariam sendo sacrificadas.
A mudança de foco em direção a mensagens políticas e sociais não se limita apenas ao gênero de super-heróis. Outro fenômeno notável na indústria cinematográfica é o declínio perceptível dos filmes de comédia. Tradicionalmente, o gênero de comédia serviu como um meio de escapismo e entretenimento, oferecendo ao público uma pausa das preocupações do dia a dia através do riso e da sátira. No entanto, nos últimos anos, houve uma notável escassez de comédias clássicas que conseguem capturar a essência do que uma vez fez este gênero tão amado e bem-sucedido.
A hesitação em abordar certos temas humorísticos, por medo de ofender ou ser considerado insensível às questões sociais atuais, parece ter levado a uma censura dentro do gênero. Isso resultou em comédias que frequentemente parecem diluídas ou excessivamente cautelosas, evitando o tipo de humor irreverente e às vezes provocativo que caracterizava muitos dos clássicos do passado. Resumindo, as poucas ditas comédias de hoje não tem graça.
Nem mesmo os animes, mangás e jogos, vindos do distante Japão, estão escapando. Já existe uma polêmica nestas adaptações no Ocidente, com casos em que tradutores e dubladores alteraram significativamente o conteúdo original para inserir diálogos e temas alinhados com suas visões políticas e sociais.